el mundial ´78
andei pela rua josé getúlio. hoje de manhã, logo ao acordar, pude ouvir os carrinhos de fórmula um chiando na tevê pebê do garagista. ainda estava meio despenteado, meio sonado. por isso andei devagarinho, na tranqüilidade, prestando bem atenção nas calçadas, nas sarjetas, desvãos. olhando pelos cantos. a sensação de que perdi qualquer coisa por ali. não sei bem o quê. até já me esqueci, mas perdi. perdi por ali. entrei na banca de jornais. a tia estava lá, puxando papo sobre o álbum de figurinhas da copa. nem falei com ela direito, fui meio babaca, matutinamente babaca. é que eu estava atento. procurando ali no revisteiro alguma pista do que tinha perdido. entrei na padaria madame. porque o rod luz ainda não estava aberto, estava com as portas baixadas. um mendigo dormia às portas baixadas do rod luz. ocupando toda a calçada. dormindo com uma calma urbana, a placidez de quem é rolling stone. sem nothing to lose. quem sabe, pensei no momento, tenha sido ele a achar o que perdi. mesmo assim, ainda entrei na padaria madame e pedi um pingado. só pra poder espichar os olhos por ali, para ter a certeza de que não, não fora ali não. o coreano do ver-o-peso já estava acordado. desde ontem ele fechou o restaurante para poder pintar de branco suas paredes, o forro pingando em jornais velhos amarelos amassados espalhados. pelo chão. tentei ler as manchetes, através da janela, mas o cheiro de tinta que escapava por debaixo da porta era assaz insuportável. se ainda houvesse qualquer coisa minha por ali, onde nunca tinha entrado antes, bueno, já estava perdida. voltei pra casa ouvindo o coreaninho chorar qualquer coisa com o pai. ele reclamava em altos brados, mais fortes que o cheiro de tinta, soluçando e se afogando naquelas palavras impronunciáveis que só os koreans entendem. ou dizem entender. deixei quieto e subi a pires da mota até minha casa, até o refúgio double tree park. cantando solito uma canção callejeira de andrés calamaro. com a leve impressão de que o pequeno coreaninho tinha encontrado por acaso qualquer coisa que eu tinha perdido.
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