As histórias de amor sempre acabam
Outro dia dei um chute em mais um emprego corporate. Fui na casa de penhor e recuperei minhalma, com sorte, por alguns bons meses. Estou numas de arrumar one day jobs. Hoje consegui um. Tinha que entrevistar um sujeito na Vila Madalena. Desci até a garagem do The Double para pegar minha montaria na selva de pedra - o Tubarão Bordô de tantas histórias. Há muito ele já não é tão vistoso. Sujo, batido, cheio de barulhinhos suspeitos, perigosos e luzes de emergência.
Mas há dois tipos de profissionais que não visito a não ser em último caso: médicos e mecânicos. Não gosto da ascendência absoluta que eles exercem sobre nós. Até mulheres são mais fáceis de se lidar. Enfim... eis que estou chegando na Vila e acende uma luz vermelha do tamanho de um polegar no painel. STOP THE CAR NOW!
Oh fuck, me fodi bonito. A temperatura marcava 120 graus e o motor no ponto para assar uma fraldinha. Numa manobra à Lewis Hamilton, joguei o Tubarão num acostamento da Mourato Coelho e fui à pé fazer meu nobre trabalho de um dia.
Na volta, dei a partida, mas o ponteiro rapidamente bateu temperatura máxima. O Tubarão é um carro, mas é também um sujeito. Um sujeito complicado. Nunca se deu bem com mecânicos. Eis que surge uma idéia que há muito fermenta nos porões de minha mente. Abandonar o Tubarão no meio da rua. Forever.
Este pobre animal agonizante não me pertence mais. Ele é agora do reino celestial das sucatas. E eu gosto de abandonar coisas. Deixar pra trás. Seguir um novo caminho. E, desta vez, à pe. Chega de carros. Chega da falsa libido dos motores. São Paulo não precisa de tubarões bordôs a infestar seus mares turbulentos.
Andei até o metrô da Vila e fui pra casa. O Tubarão será consumido en la calle. A ferrugem devorará seus interiores, como vermes a um animal de vísceras expostas. C'est la vie.
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