outside the society, they´re waitin´ for me
proibiram o ato de fumar em lugares públicos de toda a província industrial conhecida alhures como serralândia. fumar cigarro, agora, só no meio da rua. por enquanto ainda pode no meio da rua. ou só dentro de casa. ainda pode dentro de (tua) casa. essas são as duas opções que restam aos fumetas para exercerem com dignidade o hábito tabagístico. tenho pena dos mendigos. como a casa deles é na rua, bem, tu percebes que eles ficaram com ainda menos opções. estadopressão.
penso no brito. o brito terá que se trancar nas escadas de incêndio do residencial the double tree park. o brito, agora, como os pedófilos de bauru, como as dondocas da daslu, é também um fora-da-lei. um proscrito. brito, o pária. uma ameaça à sociedade.
penso no futuro da serralândia. muita gente na gran cittá. não se pode continuar a fumar assim, no mais, no meio da rua, em apartamentos exíguos. e os passantes? e os vizinhos? nã. não pode. prevejo novas ações da serralândia. prevejo-as já tem um tempo. penso que, daqui pra pouco, a assembleia legislativa acatará um projeto-de-lei do executivo estabelecendo que os fumetas ativos e os fumetas passivos que se orgulhem de sua condição serão obrigados a andar por aí com faixas azuis costuradas em suas vestes, na manga, na altura do braço direito. faixas inscritas com a letra "f" de fumeta. só os fumetas devidamente costurados às tarjas azuis nas mangas poderão comprar seu(s) maço(s) diário(s).
como está evidente desde agora que não é possivel viver assim, com cidadãos de duas diferentes categorias coabitando os mesmos espaços, essa será apenas uma solução temporária. logo os fumetas serão triados por agentes da municipalidade e serão reposicionados no mapa da grand ciudad. os fumetas deixarão a nossa companhia, pessoas de bem, que prezamos pela nossa saúde, pelo nosso bem-estar, pensamos no próximo. os fumetas serão rapidamente transferidos para bairros afastados do centro. bairros como santo amaro, granja julieta, engenheiro marsilac.
será essa a última vez que veremos os fumetas, esses seres fedulengos. arrastados pelos agentes da municipalidade, obrigados a subir em grandes caçambas e retirados à força de nosso convívio. mas ainda ouviremos, veremos notícias sobre os fumetas na tevê, no rádio, na internet. notícias que vazam por detrás dos grandes muros, altos e eletrificados, que foram erguidos em torno de bairros afastados, como santo amaro, granja julieta, engenheiro marsilac.
por essas notícias, conheceremos o futuro dos fumetas de serralândia. eles deixarão esses bairros afastados, um a um, em vagões lotados da linha férrea estadual. serão levados, com conforto e segurança, para regiões no interior do estado. pontos distantes. onde cada família de fumeta ganhará um lote de terra, uma casinha. ganhará condições de subsistir por seus próprios meios, vivendo em perfeita harmonia numa sociedade nova, uma sociedade só de fumetas, onde podem se acasalar, podem procriar e podem educar uma nova geração de fumetinhas. lá é shangri-lá. maracangalha. lá longe. bem distante da grande cidade, de todas as demais cidades. além das serras. além da serralândia.
e na serralândia tudo será diferente. as árvores mais frondosas, as águas mais cristalinas, os céus mais azuis de nuvens mais brancas, os ares mais puros. as pessoas serão mais felizes. sem câncer, sem depressão, sem problemas de saúde. as pessoas poderão viver até os 100 anos. felizes aos 100 anos. quando, enfim, morrerão suavemente, em meio ao sono, sem nem se darem conta.
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