The Pothead Blues

poesia beatnik e pensamentos nihilistas

06 agosto 2008

o robertinho

um cara boa-praça. meio lento, mas simpático a valer. simpático até demais, se tu me perguntares. deve ter sofrido um stroke, vá saber, ou caiu do berço quando bebê. talvez já tenha nascido assim. o fato é que ele é meio lento, meio bobão, bem, tu me entendes. sorriso infantil no rosto, a manha de puxar papo com desconhecidos no meio da rua, dicção meio atrapalhada, espírito desarmado, mão estendida para te cumprimentar, bom dia. sempre bom dia.
já tinha percebido robertinho no aclimation park. sentado no banco de cimento, de costas para o lago, puxando papo com os passantes. depois dei de cara com ele na padaria madame. ele me reconheceu de imediato e veio puxar papo comigo, esta figura hipster pouco afeitas a amizades e cordialidades sociais. queria saber meu nome. eu me chamo zé roberto, ele se apresentou, mas pode dizer robertinho. contou que todo dia, acorda cedo mesmo, vai até a madame comprar pão para a mãe, depois dá um rolê pelo parque. mas antes de ir ao parque, deixa o pão para mãe, para o café da manhã da mãe. e queria saber de mim, o que eu fazia, se eu ia sempre pro parque. pergunto isso porque tinha me visto por lá algumas tantas vezes. eu sou poeta, disse, vou ao parque com certa frequência para buscar um poemeto ou dois. robertinho não achou estranho eu ser poeta. robertinho é um cara que take it as it comes. sem neuras.
encontrei com ele mais duas ou três vezes na madame. olá, bernardo, bom dia para ti. robertinho nunca esquecia meu nome. vinha me cumprimentar e perguntar sobre o parque d´aclimação. vai bem, o parque vai bem. numa dessas, tomou a liberdade de comentar que me acha um cara bem forte. não sou forte, não, robertinho, sou gordo mesmo. ele riu sem graça.
há tempos não via robertinho. apenas tinha espiado sua figura sui generis, certa feita, a subir pela pires da mota. vindo lá das bandas da conselheiro furtado. renatinho com o cabelo curto, bem penteado, os óculos cdf de aro fino, a camisa polo abotoada, a calça moleton e o tênis de atleta. franzino e fracote, uns trinta e tantos anos. cheiro de talco johnson. segui robertinho de longe, intrigado, para ver se ele existia de verdade, se ele existia mesmo quando não sabia que estava sendo visto, se existia mesmo quando não estava puxando papo com desconhecidos no meio da rua. robertinho dobrou a esquina com a josé getúlio, andando ligeiro, e tomou o rumo da madame - comprar pão para a mãe.
hoje encontrei robertinho no meio da aclimation avenue.
oh, bernardo, bom dia. oh, buenos, como vai o senhor? você não tem ido mais ao parque, não é mesmo? não, não tenho ido. e os poemas? vão bem, robertinho, acordando meio tarde, mas ainda dá para pentear. boa sorte para ti então. obrigado, robertinho, obrigado. estou indo para o parque agora. tchau.

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