The Pothead Blues

poesia beatnik e pensamentos nihilistas

30 junho 2008

a little word sobre o poeta, a caca de cachorro e o junkie irlandês

a aclimação é um bairro cosmopolita encravado no coração da grand ciudad. sabemos disso. tropeçamos em coreans a cada esquina. a novidade desta manhã, no entanto, foi um irlandês junkie a tropegar pela rua josé getúlio. tipo oito e pouco de segunda-feira.
era mais uma manhã eventual na vida de berna beat, o herói da classe trabalhadora. eu subia a pires da mota vindo da aclimation avenue, feliz, lampeiro por ter aberto a semana perdendo mais de quatrocentos reais em contas e débitos bancários. eu estava no rumo do supermercado dany, como uso fazer todas as manhãs, e planejando dar aquela providencial passadinha na padaria madame para bater um café preto doce e fumegante, a única maneira de afugentar essa inverneira de minhas maltratadas e precocemente senis articulações.
te digo aqui que um simpático cachorrinho, pouco antes, tinha posto as tripas para fora ali na esquina da pires da mota com a josé getúlio, justo em frente à banca tentação. e eu estava atento e distraído, como todo poeta, dando uma espiada en passant pelas manchetes dos noticiosos diários ali dependurados quando, pfui, escorreguei bonito na caca marrom e saí deslizando pela calçada.
- watch out!, gritou um sujeito meio ruivo, meio maltrapilho, too late.
me segurei no poste e fui calcular o fétido estrago da bosta no meu pisante beat engomadinho.
- hey, man. that was awful.... let me ask you... do you speak english?
o gringo já estava ali ao meu lado, todo falante e cheio das expressões. todo friendly e puxador de papo. eu olhei prele meio de rabolho. um tanto desconfiado. minha mãe me disse para nunca falar com estranhos. nem mesmo em idiomas estrangeiros.
- yes, i do. but just a little.
eu deveria ter ficado quieto, sabe. deveria. porque aquelas minhas palavras precariamente articuladas certamente pareciam shakespeare aos ouvidos de nosso amigo irlandês, submetidos que estavam a ouvir apenas o precário português com sotaque coreano que corre pel´aclimação.
- oh, man. that´s cool. i´m from ireland, you know? i just want to have a little chat with you...
- oquei... but... what´s the problem, man?
- what´s your name?, ele me perguntou assim na lata, numa estranha indagação que me fez lembrar suddenly das minhas primeiras lições no ibi da asa sul. engraçado que nunca ouço nada assim parecido vindo de suecas ou dinamarquesas perdidas n´aclimação.
ele aproveitou para me pedir um cigarrillo.
- what´s your name?
- bem... what´s in a name? what´s the use for a name? who matters?
ele sorriu, mas não entendeu a poesia de vida ali contida.
- my name is frank. i´m from ireland. i´m trying to find any one-day job here, ´cause i lost all my money in a...
- a job? ah. tu estás a perguntar para the wrong man. i do not have a job. não trabalho. sou poeta. i´m just a poet - you know?
ele olhou pra mim de bocaberta. não estava a entender lhufas.
- just a poet, eu insisti. like... you say... yeats, right?
- like yeats. sure. i dig yeats.
- that´s it, camarada. like yeats. no money in poetry.
- what are you going to do now? can we go around and...
- bueno. agora vou ali na padaria and kill a coffee preto doce e fumegante... después, me vou pra casa. provavelmente escrever algo sobre a bosta de cachorro em que pisei. a little poem about a doggy shit, tu sabes?
ele sorriu: about dogs and irish people.

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