os ares d´aclimação
os jornais alertam sobre a secura do ar na grande cidade.
o mês de julho mais seco em todos os tempos. o cobertor de poluição a esturricar ainda mais a atmosfera urbana. o risco de problemas respiratórios devido a baixa umidade do ar: bronquite, asma, pneumonia. além do ressecamento da pele, da rouquidão da voz e da maior probabilidade de conjuntivite alérgica e/ou infarto do miocárdio.
é preciso usar vaporizadores em casa. se não o temos, espalhar pelos cômodos toalhas molhadas e bacias de água. eu não tenho vaporizador - pra quê teria? - então largo minha toalha de banho, ainda molhada, em cima do colchão beat. encho um balde de água e o coloco do lado de meu sofá hipster. num esforço concentrado, deixo levantada a tampa da privada, para que a água do celite refresque meu banheiro junkie.
os jornais mandam evitar o ar condicionado, que deixa ainda mais seco o ar das repartições. mas eles informam que, se tu estiveres preso no trânsito (acontece), melhor subir os vidros e abrir o ar condicionado do carro. porque a fumaça dos escapamentos de caminhões e automóveis engarrafados causa ainda mais irritações nas vias aéreas do que o ar condicionado.
(convém não irritar as vias aéreas justo agora que o chaos dos aeroportos foi bater n´argentina.)
terror e pânico n´aclimação: a quantas anda a umidade relativa do ar?
não dou pelota, camaradas, pois sou um retirante do cerrado brasileiro. meus alvéolos estão acostumados ao regime árido do planalto central. então fui testar, pessoalmente, a quantas anda a secura paulistana de inverno. fui bater um pé ali na rua vergueiro, entre os camelôs e os freaks que ocupam as calçadas do hospital do servidor público municipal.
te digo, aqui, que fiquei arfante depois de alguns minutos de intensa caminhada entre a aclimação e o paraíso. te pergunto se realmente será a secura do ar? ou será o gás carbônico dos ônibus da vergueiro? serão as bactérias que esvoaçam pelo ar ali perto do hospital? ou terá sido a pizza napolitana de ontem à noite?
vá saber. tomo uma sombrinha debaixo de uma árvore. um momento hyldon. pois encontrei uma frondosa árvore no canteiro central do centro cultural são paulo. aqui, a céu aberto, os estudantes vêm usar a biblioteca do centro cultural, os ceguinhos vêm tatear os livos em braile. e os mendigos d´aclimação aproveitavam este banco de madeira para uma pestana no meio da manhã. mas os cartazes nas pilastras do centro cultural informam que esses últimos - os mendigos - não são mais bem aceitos por estas bandas. segundo os informativos afixados em lugar público, os guardinhas têm a liberdade de mandar se retirar aqueles freqüentadores que não tiverem boa "higiene pessoal" ou mesmo aqueles que "carregam grandes volumes" consigo.
antes que eu comece a feder, me recupero ligeiro de minha arfante respiração e volto à flânerie, tal qual um baudelaire entregue à fuligem blade runner da vergueiro street. procurando a sombra mais próxima e depois mais uma sombra e mais uma sombra e mais outra, num salteado equilibrismo que me leve até the double tree park, até meus baldes cheios de água.
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