The Pothead Blues

poesia beatnik e pensamentos nihilistas

29 setembro 2007

the poetry still in the morning

- e tu acordou bem cedo, hein, guria?
- acordei às seis.
- acordou assim cedinho pra ir pra missa?
- eu gosto de acordar cedo pra ouvir os pássaros.
- ah. os pássaros. eu moro na aclimação. conheces a aclimação?
- claro. a aclimação, o bairro beat de são paulo. não é mesmo?
- verdade. pois aqui n´aclimação já não há mais pássaros, já não há mais o cantar dos pássaros.
- e por isso você faz poesia... não é mesmo?
- nã. na verdade, eu faço poesia pra pegar as gurias.
- acordo todos os dias com um sabiá cantando na minha janela.
- pois esse sabiá deve pegar as gurias sabiás.

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the poetry in the morning

- bom dia, guria. acordou cedo pra um sábado, não?
- sempre acordo cedo.
- pra ir pra missa?
- não. apenas durmo cedo, acordo cedo.
- e eu acabei de acordar...
- acordou com algum poema pronto, senhor poeta?
- não. mas acordei com uma música na cabeça. música é quase poesia.
- adoro música também.
- e tu curtes poesia?
- claro. adoro um poeminha quentinho logo pela manhã.
- não te importas se a metrificação vier um pouco remelenta?

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27 setembro 2007

freak old people

meus vizinhos fedem.
é bem chato ter que dizer isso. assim por extenso, visto de longe, parece algo esnobe de se dizer. parece babaca. parece preconceituoso. é verdade. mas também é verdade que fedem.
tudo bem que quando eu morava no 901, minha vizinha era a loirinha joss stone, jovem e solteira e promíscua, um símbolo sexual aqui no the double tree park. então qualquer comparação com os novos vizinhos é injusta e depravada. os vizinhos aqui no 1604 são um casal de velhos freaks. assim...
o velho é descabelado e enrugado. fuma non stop. parece um cinzeiro ambulante em calças de moleton. non stop smoking. ele vive no elevador, espalhando sua catinga pelos corredores de vários andares. também é conhecido por fazer a ronda das lixeiras. toda manhã, ele vai até o vigésimo andar e desce, pelas escadas, revirando o lixo dos condôminos. parece que já conseguiu montar um microcomputador pessoal com esse esquema. certamente conseguiu ampliar e dispersar sua fedentina.
mas o velho sai de casa porque os apartamentos do the double tree park são pequenos. e ele não aguenta ficar lá dentro com a velha. a mulher dele. porque a velha é ainda mais descabelada e enrugada que ele. ainda não pude perceber se ela também fede. provavelmente deve feder, pois é casada com um cinzeiro ambulante em calças de moleton. sempre que encontro ela no elevador, eu prendo a respiração e sorrio amarelo dizendo "bom dia". e ela pelo menos me responde. o velho, não. o velho apenas geme algo em suas entranhas.
e o apartamento dos dois velhos freaks fede de maneira obscena. logo pela manhã, quando o velho sai para sua rotina diária entre as lixeiras do prédio, o fedor de uma noite inteira de cigarros non stop escapa pela porta do 1605 e empesteia todo o corredor. a ponto de entrar por debaixo de minha porta, driblando até a barreira da cobrinha-prende-porta. tenho que acender um incenso de almíscar para rebater.
depois, no final da manhã, tipo 11 horas... é o cheiro de gás de cozinha que escapa do 1605 e me faz acender mais um incenso. o metano é um gás inflamável criado pela decomposição do lixo caseiro. acho que é metano o gás que sai da fétida alcova dos velhos freaks. um dia desses, the double tree park vai pelos ares. bou. e eu já sei o porquê.
depois do fedor do metano, o fedor que escapa pelas frestas do 1605 é ainda mais revoltante. é o cheirinho da comida caseira preparada com esmero pela velhinha. de revirar o estômago. e é esse o cheiro que começa a invadir meu cafofo beat no momento em que batuco estas linhas. me fez perder a fome. não vou almoçar hoje. não vou almoçar nunca mais.
certa vez, bateu aqui o entregador de água. abri a porta e o rapaz estava petrificado. segurava o galão de 20 litros no ombro e me olhava assustado. "que cheiro dos diabos é esse?" percebi em seu olhar um condenatório caráter de censura. como se estivesse diante do responsável por empesteio tamanho. apontei em silêncio a porta vizinha. e olhei pro chão. envergonhado.
certa vez, a dods do 1603 bateu aqui em casa. "esse cheiro de gás, o senhor está sentido?" claro que estou, até um cego sentiria. "o senhor está com o fogão ligado?" não. só uso o fogão pra ferver água. então apontei em silêncio a porta vizinha. e olhei pro chão. envergonhado.
certa vez, o porteiro do the double tree park me ligou pelo interfone. "senhor poeta, com licença, mas o senhor está usando o fogão?" não. só uso o fogão pra ferver água. "mas o senhor está sentindo cheiro de gás no andar?" claro que estou sentindo, meu velho, não há nada que um poeta não sinta.

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26 setembro 2007

the meat i eat for dinner must be hang up for a week

o açougue fica lá atrás no supermercado. ocupa toda a parede dos fundos, com uma portinhola que dá para o frigorífico. ali dentro, longe dos olhos obsequiosos e enojados de vegans e mocinhas pueris, estão dependuradas e refrigeradas algumas toneladas de carne vermelha, provenientes do abate clandestino de bovinos na grande são paulo.
e as pessoas fazem fila por ali, no açougue do supermercado dany, todas as manhãs. para comprar carne para o almoço. fazem fila esperando a atenção passageira do açougueiro. afinal esse é um dos homens mais importantes e disputados do dany, mais até que o padeiro, que o moço que pesa os legumes, mais até que a japinha sorridente que cuida da máquina de cartão de crédito.
as pessoas pedem carne moída ao gentil rapaz de avental ensangüentado. meio quilo de acem moído. três bifes de picanha. uma ponta de lagarto caprichada, 17 asas e 47 corações de galinha. por obséquio. todos são gentis com o açougueiro. talvez em deferência ao avental ensangüentado. talvez persuadidos pelo facão. talvez por apenas boa educação.
mas eu sou como as hienas da savana africana. não chego ao supermercado sabendo o que vou pedir ao diligente rapaz com o facão ensangüentado. não escolho minha presa. apenas bato o olho na vitrine do açougue e cato ali as bandejas preparadas dois, três dias atrás. escolho o naco de carne menos arroxeado. e sigo adiante. deixo os gourmets e as donas-de-casa d´aclimação discutindo peças e cortes com o misericordioso açougueiro ensangüentado.

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25 setembro 2007

a.e.s. eletropaulo

recebi três contas de luz, em um único mês.
sou, realmente, um sujeito mui iluminado.

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24 setembro 2007

the aclimation beach

dá pra ver a piscina do the double tree park aqui do alto do 1604.
eu gosto de espiar a piscina do the double tree park, de um azul empoçado lá embaixo. acho bucólico seu azul clorificado.
a piscina está quase sempre vazia. menos nas tardes quentes de domingo. quando as gurias do the double tree park arriscam deixar seus apartamentos para tostar a pelezinha branca paulistana no sol de domingo.
as gurias do the double tree park são muito comportadas. elas não praticam topless. apenas deitam de bruços e desatam a parte de cima do biquini, mostrando as costas nuas. com o cuidado de não tomar sol demais.

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hope i never lose my wallet

"num dia quente
a maionese pode te matar
é o que minha tia me contou
ela também me disse
que eu jamais saísse sem minha carteira
no caso de eu ser morto
eles vão precisar dela para identificar o cadáver"
(sam shepard)

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the poetry as an exibicionism

- mas e então, guria, tu curtes poesia?
- claro. adoro poesia. por quê?
- porque sou poeta.
- sério?
- claro.
- nunca imaginei que fosse poeta.
- eu disfarço bem.
- então seja gentil e faça uma poesia pra mim.
- agora?
- sim, agora.
- mas aqui mesmo? com todo mundo vendo?
- você se sente inibido?
- é que eu... eu nunca fiz poesia em lugares públicos.
- então improvise.
- mas as pessoas... o que elas vão dizer?
- relaxe. as pessoas em são paulo não se importam com os outros.
- tudo bem... tu curtes alexandrinos?

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23 setembro 2007

idiot wind

o vento faz a curva aqui na esquina da pires da mota com a loureiro da cruz.
o vento d´aclimação é o ar que sopra na gaitinha de roberto zimmerman.
blowing everytime you move your mouth
blowing down backroads headin´ south
cochilo por um instante no meu sofá hipster e acordo com janelas - baam - e portas - práá - se arrebetando contra as paredes. acordo com a fúria da natureza urbana cinzenta.
blowing everytime you move your teeth
you´re an idiot, babe, it´s a wonder that you still know how to breath

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lavagem delicada com múltiplo enxágue

fui lavar minhas ceroulas pesadas. mais de seis quilos de carga
agora a máquina de lavar ronca com minhas cuecas samba canção. um ruído mecânico, metálico, de engrenagem prestes a romper em duas.

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21 setembro 2007

robby keane ou o descompasso da poesia cotidiana

o edredon demasiado pesado e o inverno de 34 graus te chuta da cama antes das oito da manhã. então tu é um cara saúde, por isso acorda alegre pra escovar os dentes, passar fita dental entre os dentes remelentos, bochechar listerine sabor laranja. cata o jornal no sopé da porta. fica pelado no meio do corredor, só pra espiar o movimento, esperando ser encontrado pelo seu brito. mas desiste e entra pra casa again. lê no jornal que vai ter um show do seu jorge, e de imediato decide não ir nem fodendo. atravessa a sala e abre a varanda beat, o ventinho árido que sopra da cantareira bate no teu peito, levantando um pouco de fuligem entre os pêlos. do outro lado da pires da mota, operários gritam do último patamar da construção. tu grita de volta, mas eles nem te ouvem. fingem não ouvir? então tu liga o liquidificador pra abafar os operários e pra bater um diet sucks sabor morango. a tevê pipica num estalo. antero greco está preocupado com o futuro do chelsea sem josé mourinho. o ventilador no máximo, a conexão banda larga piscando as luzinhas verdamarelas. a poesia. ** Putariaa oonline sem pagar naada aqui é seu lugaar ** é impossível ser feliz sozinho. cansei da segunda pessoa então abro a agendinha de couro. agenda pequena, de caber no bolso do terno que não uso. apenas seis linhas por dia. a dificuldade de encher as seis linhas. não, a poesia terá que ser adiada. preciso de uma lauda sobre o rock de brasília dos anos oitenta. e tenho que sedutor ao reconstituir o tempo que não vivi. rock europeu, rock europeu, você nem imagina o que não conheceu. preciso de uma lauda sobre bartleby e herman melville. tento ser sedutor e te falar do niilismo aplicado aos pequenos gestos do cotidiano funcional. e preciso ler mais sam shepard para fazer incríveis adaptações teatrais ousadas e avant garde. quero ser beat. quero ser avant gard novamente. preferia não fazê-lo. ** Putariaa da melhor qualiidaadee você soo eencontraa aquii, tudo gratis venha ** já estou quase indo, um minutinho por favor.

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20 setembro 2007

Antes da guerra estourar eu estarei seguro

Só me deram uma vida. Uma meia dúzia de décadas. Com sorte. Um pouco pra mais, um pouco pra menos. E ainda querem botar moral. Pagar sapo, botar terno e gravata. Porra, não sabem que me aperta o pescoço? Nasci pra ficar pelado. Querem me vender carros. O que eu vou fazer com o Crossfox? Ou o Fiat Idea. Any idea? Querem me vender apartamentos. “Portas e janelas blindadas. Piscina com água tratada. Porteiro robô 24 horas.” Um investimento pro futuro. Que futuro? A morte? Um mausoléu fashion, então. Querem que eu procrie, vejam só. Deixe um legado, novas gerações. Sim, sim, vou procriar pra caralho. Assim como um coelho. Por aí.

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18 setembro 2007

e então?

e então?
qual o preço que você paga pra se sentir seguro?
qual o preço você paga pra chegar no futuro?
quantas moedas colocam você em cima do muro?

(ademir assunção)

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17 setembro 2007

mundo animal

a raposa sapecou o galo do leão. e o coelho descontou em cima da foquinha.

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12 setembro 2007

desastre ambiental

do noticiário internacional...
"O Nahuati, 'cacto mágico' dos índios mexicanos que atraiu gerações de jovens turistas europeus e americanos ao longo dos anos por ser um vegetal rico em mescalina, produto alucinógeno que estimulou e fez os escritores da geração beat 'sonhar', segundo o jornal La Reppublica, pode estar em vias de extinção. Ainda não se sabe quanto tempo pode levar para o Lophophora williamsii (nome científico) desaparecer, pois não há provas concretas que indiquem a extinção, de acordo com artigo do jornal Financial Times. Entretanto, especialistas garantem que está cada vez mais difícil encontrar o cacto no deserto na região norte do país. "
(nota da redação TPB - financial times?)

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11 setembro 2007

Curtes?

- E aí guria, curtes sexo violento?

- Ai que horror

- Ops, me desculpe, acho que não era essa a pergunta

- Humpt

- Mas, me diga, curtes uma fejuca esperta?

- Fejuca? Que diabos é isso?

- Porra fejuca, saca? Aqueles feijões pretos...com suculentas anatomias de porco boiando.

- Eca!

- Couve, laranja...

- Pare, seu imbecil!

- Péra, péra. Agora sim. Já sei! Porra, guria, tu curtes poesia??

- Ah, poesia. Não, não. Acho muito chato.

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10 setembro 2007

Farewell transmission

Já não me lembro mais
O ano da vez
(2006? 2007?)
O mês vigente
O dia da semana
Perdi o fio

Foi um amor que tive
Sumiu na neblina

Aquele beijo de ontem
Teu cheiro
Teu colo
De qualquer perfume

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07 setembro 2007

almost independence day

abri dois botões da camisa. sentei na varanda. abri mais dois botões da camisa. vigiando o movimento das nuvens. tirei a camisa. espiando o cume dos espigões lá longe, apertando os olhos pra enxergar a pontinha da antena. vontade de voltar a fumar.

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botas pesadas

the bottoms of my shoes
are clean
from walking in the rain

(kerouac)

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03 setembro 2007

I don´t wanna fall in love (música da semana)

I would like to tell you, I would like to say
That I knew that this would happen
That things would go this way
But I cannot deceive you, this was never planned
I know that you're the right girl but do you think that I am the right man?


chorus
Right face wrong time, she's sweet
(But I don't wanna fall in love)
Too late, so deep, better run cause
(but I don't wanna fall in love)
Can't sleep, can't eat, can't think straight
(I don't wanna)

You say it's not a problem, You say it's meant to be
But love is not an option, our love is never free
And things are not so easy, so cold and we've been burned
I know that I'll have regrets but that's the price of one more lesson learned

chorus
Right face wrong time, she's sweet
(But I don't wanna fall in love)
Too late, so deep, better run cause
(but I don't wanna fall in love)
Can't sleep, can't eat, can't think straight
(I don't wanna)

("she wants revenge")



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01 setembro 2007

observatório da imprensa

"dos trezentos dólares em dinheiro fornecidos pelos editores da revista, quase tudo já tinha sido gasto em drogas altamente perigosas. o porta-malas do carro mais parecia um laboratório móvel do departamento de narcóticos. tínhamos dois sacos de maconha, 75 bolinhas de mescalina, cinco folhas de ácido de alta concentração, um saleiro cheio até a metade com cocaína e mais uma galáxia inteira de pílulas multicoloridas, estimulantes, tranqüilizantes, berrantes, gargalhantes... além de um litro de tequila, outro de rum, um caixa de budweiser, meio litro de éter puro e duas dúzias de amilas.
tudo isso tinha sido coletado na noite anterior, durante um passeio em alta velocidade por todo o condado de los angeles, de topanga a watts, pegando qualquer coisa em que conseguíssemos pôr as mãos. não que precisássemos de tudo aquilo para a viagem, mas, quando alguém se dedica de verdade à tarefa de montar um suprimento de drogas, a tendência é levar a coisa a sério.
só o éter me preocupava de verdade. nada neste mundo é mais inútil, irresponsável e depravado que um homem completamente chapado de éter. e eu sabia que não iria demorar muito para que nós usássemos aquela porcaria. talvez acontecesse no próximo posto de gasolina. já tínhamos experimentado quase tudo, e agora... sim, havia chegado a hora de dar uma boa cafungada no éter. e então dirigir por 150 quilômetros num estupor horrendo, babando como se tivéssemos paralisia cerebral. quando alguém está chapado de éter, a única maneira de se manter alerta é tomar um monte de amilas - mas não de uma só vez. tem que ser aos poucos, apenas para manter o foco enquanto cruzamos barstow a 140 por hora.
'cara, é assim que se viaja', comentou meu advogado, e se inclinou para aumentar o volume do rádio."
(hunter s thompson)

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